Friday, December 22, 2006

Vitor Mizael - Entre


entre ossos e vestes – o corpo
entre o Mundo e o corpo – o Ser
entre o Ser e o Mundo – as palavras
entre o corpo e o Mundo – as vestes
entre os ossos e a carne – o Ser



Os trabalhos de Vitor Mizael tratam do ser e do estar no Mundo. Para tanto, o artista trama um discurso em que funde verbo e densidade imagética.
Em seus desenhos, colagens, gravuras e outros meios, utiliza um repertório de imagens – peças de roupas e ossos – e de palavras escritas – solidão, tristeza, angústia – que se tornam recorrentes. Entretanto, estes elementos não aparentam ser o alvo central de sua atenção. Parecem eles se disporem a apontar o que não se disse diretamente, o que ficou velado. Mais do que se deter nas figuras e palavras, o artista suscita um entendimento para o que se configura entre elas. E, então, entre ossos, roupas e palavras, o ser.
Necessário faz-se, para se constituir como um ser, o amálgama dos elementos naturais com os espirituais (ou da cultura). E, o reconhecimento de si por si e pelos outros se dá pela combinação singular de características corpóreas e fisionômicas, traços de personalidade, valores e comportamentos.
Tomando este pressuposto como referência, observamos que, em muitos de seus trabalhos, Mizael apresenta-se em auto-retratos. O auto-retrato - idéia de se observar e representar-se - trabalha com a compreensão do reconhecimento do eu e do seu papel diante do Mundo e diante do outro. Todavia, neste processo, não identificamos, nas obras do artista, um ser individualizado por aspectos corpóreos físicos, nem por palavras que os descrevam. O que temos é o reconhecimento de si como criatura universal, representada tanto em sua constituição orgânica (os ossos) como cultural (vestimentas e palavras).


Auto, retrato, 2006


Revelar a parte da existência que se transfigura para além de qualquer imagem particular – se identificar, no se auto-retratar, como ser natural e ser cultural, e, nos dois casos, se dissolver na caracterização de estados da alma (tristeza, solidão, angústia) e na ausência de caracteres físicos singulares – evidencia o desejo de se encontrar no coletivo, de se reconhecer no outro.
Para tratar do Ser, suas dores e angústias, o artista se apresenta como ser encarnado em forma de corpo, porém, apenas expondo os aspectos internos e outros externos a este, ou seja, ossos e vestimentas.
Articular o palpável (materialidade do ser) com o intangível (a existência do ser pelo verbo), eis aí um dos desafios ao se elaborar cada trabalho.
Como cada indivíduo se apresenta singularizado em um corpo, é quase indispensável tomar este como referência do ser. Contudo, não observamos, na obra do artista, o corpo - evidência da existência enquanto matéria - representado em suas carnes, mas pelos ossos que o estrutura. Por outro lado, as roupas vazias, soltas no negro do plano, funcionam como índice da corporalidade, da existência física do ser. O corpo, neste caso, é evocado pela sua ausência.
E, as palavras - códigos assim como gestos e vestimentas - revelam o ser ao Mundo e estabelecem a relação entre o espírito e todas as outras coisas. Sentimentos e sensações são, também por estes canais, expressos. E a existência do ser, seu estar no Mundo, assim se pronuncia.


Auto-retrato, 2006

Pelos caminhos que fogem do entredito, evitando o explícito, o imediato reconhecível, Mizael busca, por meio da representação do individual que se encontra no universal, aquilo que não está nas coisas, mas o que liga as camadas da matéria à essência, o que não se traduz por formas, o que fica entre.



Paulo Trevisan

sites:

http://www.pcarp.usp.br/acsi/mat13.htm

http://ubbibr.fotolog.com/vitormizael/

http://braziliandrawsandpaints.blogspot.com/2006/06/vitor-mizael-i.html