Sunday, January 04, 2009

Artes no Brasil em 1968

Considerado um dos momentos mais marcantes daquela década, o ano de 1968 foi marcado por manifestações políticas, comportamentais e artísticas que propunham a abertura para novas possibilidades da existência humana.

As artes plásticas produzidas no Brasil de então são um sintoma dos movimentos propositivos e de renovação que se desenvolveram ao redor do mundo ao longo dos anos 60.

Dois posicionamentos perante o fazer artístico apontavam para as consideradas vertentes mais atualizadas no período. Por um lado tínhamos uma figuração de aspectos extraídos da linguagem visual dos meios de comunicação em massa; por outro, as manifestações de ruptura com os suportes convencionais (como a pintura sobre tela e as esculturas naturalistas em bronze ou mármore) e a radicalização da arte como proposição participativa e não apenas de visualização contemplativa.

Este estado das coisas no campo das artes visuais brasileiras era decorrência de quase uma década de pesquisas e alinhamento com o cenário internacional que se abria para a revigoração de preceitos que partiam das propostas mais radicais das primeiras décadas do século XX, tais como o Dadaísmo e os postulados de Marcel Duchamp.

A apropriação, a participação, a percepção corporal (individual ou coletivo) no contato do público com a obra (ou proposta do artista), e um sentido anti-estético, foram trabalhados por artistas como Lygia Clark, Hélio Oiticica e Lygia Pape. Estes anti-artistas faziam a aproximação máxima entre arte e vida.
















Lygia Clark
Diálogo - Óculos, 1968

O uso do vocabulário formal extraído das linguagens da comunicação de massa funcionava como instrumento para um outro grupo de artistas alinhados com a pesquisa e renovação na prática artística figurativa. A linguagem Pop, de cores vibrantes e planas, contornos definidos, contrastes marcados e uma tendência à síntese formal, era o recurso utilizado para a apresentação da consciência artística sobre a realidade brasileira – consciência tomada pela presença das forças ditatoriais do Regime Militar implantado em 1964. Imagens extraídas de jornais e revistas e reelaboradas pelos artistas foram apresentadas em obras de Rubens Guerchmam, Antonio Manuel, Cláudio Tozzi, Antonio Dias e Anna Maria Maiolino. O teor político destes trabalhos permite que possamos elevá-los à categoria de obras-denúncia.

Estas duas posições diante das possibilidades mais avançadas de criação artística, muitas vezes se emaranhavam em trabalhos que buscavam um sentido participativo e ao mesmo tempo atrelavam-se a uma figuração ou alusão ao contexto sócio-político. Isto é visível em parte da produção daquela época de Nelson Leirner e Wesley Duke Lee.







Rubens Guerchman

Policiais Identificados na Chacina (Registro Policial), 1968
colagem, espelho, asas de borboleta
e madeira, 167 x 150 cm



Em 1968, tínhamos no Brasil uma efervescência cultural que perpassava as artes visuais e viabilizavam a experimentação e o envolvimento crítico perante a realidade. Conseqüência de um processo desencadeado no início da década, esta efervescência atingiu sua plenitude nos últimos anos da década de 60. Porém, não perdeu sua vitalidade e continuou funcionando como propulsora para o desenvolvimento futuro das artes. A força criativa pregada naqueles anos gerou um legado de obras de alta qualidade formal e simbólica e possibilidades de experimentação que podemos identificar ainda atuantes nos dias de hoje.





Hélio Oiticica

Seja marginal seja herói, 1968
Estandarte (tecido e serigrafia)