Monday, March 19, 2007

Thais Albuquerque - Fantasmagorias na Pintura

Como pintar hoje sem não se debater com a tradição artística mais consolidada e discutida no ocidente? Como pintar com relevância para os enfrentamentos culturais dos nossos dias?
Respostas a estas indagações é o que parece promover as pinturas de Thais Albuquerque. Sua produção pictórica põe em discussão a percepção da própria história da pintura. O modo de trabalhar da artista se relaciona com o meio mais tradicional de pintar e guarda, portanto, relações com os grandes mestres do passado. Suas criações vêm fecundadas com o que de melhor ficou destes pintores.
Distante de prolongar pensamentos greenberguianos de superfície, ou de tendências dos oitenta do século passado como o transvanguardismo de Bonito Oliva, Thais parece não buscar qualquer tipo de inovação ou avanço em relação à história da pintura, mas adota uma atitude que se transforma em uma espécie de revelação do sentido da tradição pictórica na atualidade. Demonstra um embate determinado no desvelar do real papel, nos nossos dias, da Pintura de outras épocas. Com crueza nos apresenta o estado de horror causado pelo passar do tempo sobre a Arte e suas obras. No fim tudo se esmorece.

Uma Rainha para Bacon, 2005
pintura mista sobre madeira, 150 x100 x 3 cm


Suas pinturas se revelam assombrosas. São espectros de uma tradição cansada, exaurida. Projeções fantasmagóricas de obras de grandes mestres como Botticelli, Bacon e Vemeer. Constituem-se de fatura agressiva - arranhaduras, raspagens e pincelados fortes – e de tons pesados, escuros ou pálidos, estruturados pelo esmaecido, pelo esbranquiçado e pela cor do não vívido.
Suas figuras surgem apavorantes. Sem olhos, com expressões pesadas, melancólicas, tez pálida e fria, vestes de modas remotas, assim emergem as personagens de obras de antigos mestres que parecem terem sido deslocadas de seus suportes originais (que lhes configuravam graça e vivacidade) para migrarem para nosso tempo – uma outra realidade, distante de seu momento de fecundação e auge de significação -, agarrando-se agora, para sobreviver, em pedaços abandonados de madeiras e telas e evidenciando, por conseguinte, seu cansaço e sua ausência de vitalidade. São figuras que parecem revelar a exaustão de suas existências prolongadas pela obrigação e pelo peso da memória.


Sem Título, 2005
pintura mista sobre madeira, 48 x 23 x 3 cm
Coleção Particular, SP


Vênus de Botticelli, 2005
pintura mista sobre madeira, 110 x 110 x 2 cm


A artista sente a referência com respeito, mas percebe o estado genuíno das coisas, do real grau de latência germinadora daquelas antigas obras dentro do hoje. Um papel de fantasmagorias. Por isso, nos oferece uma apresentação do significado cultural atual destas obras dentro de sua própria pintura. Uma pintura consciente de ser pintura feita pós-Rafael, Rembrandt e Caravaggio, pós-El Greco e Goya, Cézanne e Picasso, pós-Rothko e Bacon. Uma pintura que não poupa a Pintura e revela seus mortos ainda vivos. Que trata do hoje sem renunciar ao ontem. E não se intimida em revelar o peso da passagem do tempo sobre os povos, as culturas, a pintura e a Arte.



Paulo Trevisan, 2006


A Noiva, 2005
pintura mista sobre madeira, 150 x 100 x 3 cm
ver:

1 comment:

Srta T said...

não sei se te interessa mas acho que sim,
http://cienciaecultura.wordpress.com/2007/03/26/por-que-a-natureza-e-bela/

é de um amigo meu. físico! beijos,

T