Tuesday, July 06, 2010

ARTE DA FICÇÃO - ALEX KALEB ROMANO E KIKA GOLDSTEIN

Nas viagens de Gulliver gigantes existem. Aladim conhece um gênio. Alice encontra um risonho gato que flutua no ar. No mundo da imaginação tudo se fabula. No campo do irreal a realidade é fiada. Com palavras tecemos figuras. Com imagens podemos encadear narrativas. Alex Kaleb Romano e Kika Goldstein constroem suas trajetórias artísticas dentro destes parâmetros.
Criaturas fantásticas - habitantes de sonhos, seres criados pelas cores explosivas e vibrantes e pelas formas macias e outras quase diáfanas - povoam o mundo formado pelos trabalhos de Kika Goldstein. Em suas pinturas recentes já não conseguimos mais identificar um lócus que possa ser reconhecido pela nossa memória da experiência concreta. Podemos, por aferição, sugerir possibilidades de “reconhecimento” de um mundo subatômico, de uma paisagem extraterrestre ou de um mergulho microscópico em algo orgânico. Então, nossas referências parecem ter que ser suportadas pela nossa vivência com as narrativas ficcionais de ciência ou do fantástico. Não mais conseguimos definir a imagem pela experiência com o real, mas tão somente podemos nos aproximar dela pela imaginação.
Figuras de linhas finas, personagens feitos de formas vazadas ou que se configuram com a paisagem, estes são seres que encontramos nas imagens impressas ou desenhos de Alex Romano. Muitas destas figuras se conformam não em camadas, mas por integração com o conjunto – desenho artesanal participa de cenários fotográficos manipulados em computador. Ambientes naturais e vistas urbanas se fundem em seres de presença delicada e estranha. Um discreto desespero parece tomar conta destes simpáticos nativos da afeição visual e este sentimento torna-se manifesto por estes tão gentis seres por meio de gestos largos ou expressões melancólicas e contemplativas.
Entre a produção de Kika e Alex, além da aproximação que é dada por este clima irreal e fabuloso que os dois artistas articulam, também é possível reconhecer um modo de figurar que guarda relações com uma mesma matriz: a cultura visual urbana dos cartoons, HQs, grafites, ilustrações e charges. Em ambos os artistas, as obras se dispõem de uma maneira visual direta e afável, de agradável deglutição aos olhos. O modo de figurar e os tipos de seres e locais criados pelos dois parecem estabelecer contatos com um outro universo criativo que extrapola o das artes visuais - o narrativo das letras, do cinema e animações. O poder de sugerir imagens, situações interrompidas - quase frames de cenas - tudo isso faz com que os dois se tornem ficcionistas visuais, escritores de imagens.

Paulo Trevisan

texto para o convite

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